terça-feira, 20 de maio de 2008

Em terras italianas

Salve, salve!

“Eccomi” com novidades e històrias para contar. Porém, antes de começar a escrever para valer, peço desculpas com relaçao a falta de alguns acentos. Os teclados da “vecchia bota” nao possuem o ‘tio’ e nem o circunflexo, o famoso chapeuzinho do vovo.

Bom, vamos là – Ah! E esqueçam o acento agudo no à, ì, ò e ù. Sò mesmo no é.

Como fiquei sem dizer para que cidade viria, é hora de falar. Estou morando em uma provìncia de Trieste, na regiao autonoma de Friuli-Venezia Giulia, nordeste italiano. Uma palavra para resumir o lugar: tranquilidade – nada de ‘trema’ também.

Aqui nao se escuta motores e businas de carros e motos, nao hà prédios e gente apressada. A trilha sonora fica por conta dos pàssaros – das espécies mais variadas –, que cantam de maneira harmonioza, regidos pela natureza e o pano de fundo para essa sinfonia e o verde das matas. As construçoes e as ruas do local nos levam a um passado, nao tao distante, onde era possìvel passear a qualquer hora, sem se preocupar em ser abordado por alguém mal intencionado, e as trancas nas portas servem mais para embelezà-las.

E’ um lugar de pessoas simples e de bem, que possuem um pedacinho de terra (na maioria das vezes perto das residencias) e cuidam dele com muito carinho. Agora mesmo, durante a produçao deste texto, escuto o barulho do ùnico motor que funciona na localidade: de um trator.

Sinceramente, acho que até o relògio, aqui, tem vontade de parar um pouquinho e apreciar as belezas naturais. Podem até dizer: “nossa, deve ser um tédio!”. E’ de um “tédio” desses que as pessoas necessitam para dar valor nas coisas simples da vida.

Na localidade onde estou em, mais ou menos, uma hora e meia de caminhada, voce ouvirà: “Doberdan”, que significa ‘Bom dia’ em Esloveno. Aliàs, as placas de sinalizaçao, propaganda, institucionais sempre estao em Esloveno e Italiano e a maioria dos moradores fala os dois idiomas. Eu, por enquanto, sò fico no “Doberdan”.

Apòs esse panorama, bem resumido, vou contar como foi minha viagem do Brasil até a Itàlia, como dei entrada no processo de reconhecimento da minha cidadania italiana no Comune e alguns outros fatos.

DEIXANDO A BELA E SANTA CATARINA...

Saì de Florianòpolis dia 13 de abril, domingo, pela manha, com destino ao aeroporto de Congonhas, Sao Paulo. Nunca tinha andado de aviao em minha vida e a primeira experiencia foi muito boa, apesar de, para mim, como sempre, utilizando outros meios de transporte, o espaço entre as poltronas ser pequeno. Do jeito que eu sentei, fiquei e orei para que o passageiro à minha frente nao abaixasse o encosto.

Foto tirada pela minha tia, Maria Aparecida, quando o aviao levantou voo em Floripa com destino a Sao Paulo:





Desci em Congonhas por volta das 11h20, peguei minhas malas e o onibus que faz o trajeto até Guarulhos. Feito o percurso, cheguei ao aeroporto internacional às 12h45. Coloquei minha bagagem em um carrinho e comecei a andar a procura do guiche da Swiss – empresa que me levaria a Zurique, Suìça, e, depois, até Milao.

O meu voo estava marcado para às 18h45 e pelo que notei os suìços operam poucos, pois o balcao para confirmar o embarque ou, como gostam de dizer, fazer o “check-in” ainda nao estava aberto. O que eu fiz? Iniciei a conjugaçao do verbo que mais mentalizei antes de vir para a Itàlia: o esperar. Procurei um lugar para me acomodar e esperei, até que là para às 15h30 confirmei meus dados, despachei minhas malas e peguei minhas passagens.

Fiquei mais tranquilo, porém faltavam mais de tres horas. O que eu fiz? Isso mesmo. Esperei. Mas dessa vez com uma distraçao: assisti ao primeiro jogo da semifinal do Campeonato Paulista, entre Sao Paulo x Palmeiras, e em pé! Mas eu nao estava sozinho. Em poucos minutos se reuniram os sao-paulinos de um lado e, do outro, onde eu estava, os palestrinos. Uma “arquibancada” no aeroporto, sem brigas e com muitas risadas.

Para resumir esse ponto, pois jà sei que meu glorioso Palestra Itàlia foi campeao, quando o Palmeiras fez o gol de penalti eu estava na fila do passaporte da Policia Federal. Vibrei junto com outros palmeireneses que estavam ali, mas fiquei chateado porque nao poderia acompanhar o segundo jogo pela TV jà que estaria na Itàlia. Paciencia… Aqui “faccio il tifo per la Roma”.

ARRIVEDERCI, BRASIL...

Voltando ao assunto viagem – agora de Sao Paulo a Zurique – tomei um susto quando vi o aviao no qual eu viajaria. Gigante. Pensei comigo: “acho que nesse, mesmo na classe economica, nao terei problemas e haverà espaço para as minhas pernas”. Ledo engano.

O jeito foi “filosofar”: ‘antes as pernas doendo do que o bolso apertando’, jà que o preço de uma passagem de primeira classe, onde hà espaço para uma piscina olìmpica, està totalmente fora de minha realidade. Entrei no aviao, torcendo por uma presença feminina no assento ao lado. Adivinha? Nada. Havia um alemao, barbudo. O voo seria, ainda, mais longo.

18h40. O aviao começou a fazer manobras para decolar e o comandante a falar. Dois minutinhos e ele anuncia que tem autorizaçao. Dito isso, sò senti o baque e a força das turbinas “empurrando” meu corpo contra a poltrona. Subida perfeita, com friozinho na barriga e tudo.

Altura de 10.800 metros a uma velocidade média de 950 Km/h, o aviao margeou todo o litoral brasileiro até chegar à ponta do nordeste e seguir sobre o Oceano Atlantico. Como eu sei esses dados e rota? Estava tudo a minha frente, em um computador, onde eu podia acompanhar as informaçoes de voo, escutar mùsica ou ainda ver um filme. Na classe economica! Para um “pé veRRRmeio”, como eu, que saiu do noRRRte do Paranà, coisa de outro mundo.

Revirei aquele computador, mas nao encontrei musicas e filmes do meu agrado. Nao sou enjoado. Apenas gosto de entender o que estou ouvindo ou vendo, e filmes e cançoes em alemao nao ajudariam. Fiquei mesmo acompanhando, durante toda a viagem, o mapa, a altura, velocidade, temperatura etc.

CADE O BOTAO?

Là pelas 21h inìcio a “briga” com a minha poltrona. Por que? Olhei para o lado e vi vàrias pessoas com o assento inclinado para tràs. Das minhas experiencias de muitas viagens de “busao” pelo sudeste e sul do Brasil, começo a passar as maos nos braços da poltrona a procura de um botao ou algo parecido. Passa a mao ali, là, do outro lado e nada.

Comecei a ficar inquieto, pois nao conseguia inclinar meu assento para descansar. Fuça de cà, de là e nada novamente. Eu nao ia chamar a comissària de bordo por causa de um botao que estava ali e eu nao encontrava. Mais alguns minutos de tentativas e desisto. Vem a primeira refeiçao da noite. Eu peguei uma àgua e um sanduìche. Jà o alemao, ao meu lado, mandou ver uma bela “pasta” e vinho. E o pior: ele também estava com a poltrona inclinada para tràs!

“Vou ter de perguntar a ele como inclinar o assento”, pensei comigo. Em alemao, sem condiçoes, porque nao sei uma palavra. Ingles? Talvez, mas preferi arriscar com meu italiano. Mandei: “Capisci l’italiano”? Ele me olhou, pensou um pouquinho, e pegou a garrafinha de vinho que estava tomando e apontou com o dedo indicador, dizendo: “Ya”.

E’, percebi que teria de apelar para o idioma universal dos gestos. E là se foi o Guaita, com uma das maos, mostrando a posiçao da minha poltrona e com a outra, apontando o assento dele – que estava inclinado. Ele fez uma cara de quem nao estava entendendo absolutamente nada. Comecei a fazer gestos de uma poltrona que abaixava e ele, graças a Deus, entendeu, mostrando onde estava o “maledetto” botao. No braço direito da poltrona, na parte interna. Nao havia olhado naquele local, sinceramente. Ficou a parte engraçada do fato.

EM ZURIQUE...

E quem disse que eu, mesmo com o assento inclinado, consegui dormir? Nada de pegar no sono. Apanhei as circulares do Governo Italiano sobre o processo da cidadania e comecei a le-las para passar o tempo. Quando me dei conta, o aviao jà estava quase sobre a Espanha. Olhei pela janela e, infelizmente, havia muitas nùvens. Foi assim até Zurique – tanto que o pouso foi feito por meio de equipamentos.

Bom, às 11h22, jà horàrio local, desci do aviao e saì a procura do metro do aeroporto que me levaria para um outro setor – o de voos domésticos – para, enfim, pisar em solo italiano. Pensei que iria ter problemas para encontrar. Eu nao conheço outros aeroportos pelo mundo, mas fiquei impressionado com a facilidade de se movimentar dentro do de Zurique e com a excelente sinalizaçao. Encontro o caminho rapidinho e entro no metro, sò com a mochila e documentos – minha bagagem despacharam diretamente para Malpensa.

Meu voo para Milao estava marcado para às 12h35. Cheguei ao setor com tempo de sobra. Passei pelo dector e entrei na àrea de espera. Tudo isso às 11h43. Alì, sim, comecei a me sentir na Itàlia pela primeira vez durante a viagem. Por que? O idioma predominante na sala era o italiano.

Passadoss alguns minutos, um policial da imigraçao italiana montou, em frente ao guiche de embarque da Swiss, um balcaozinho, onde ele conferiu o passaporte e carimbou a passagem. Esse procedimento foi apenas um controle. Naquele momento, comecei a rir sozinho, lembrando de uma animaçao que vi certa vez na internet sobre a diferença entre os italianos e o resto dos europeus. Dentre as vàrias, o autor ilustrou como era uma fila formada pelo resto da europa e depois por italianos. Na primeira, todos ficavam organizados, um atràs do outro. Jà quando os italianos “faziam” a fila, era um atràs, um do lado direito, do esquerdo. “Un vero e proprio casino”.

Foi isso que aconteceu quando o policial começou a olhar os passaportes e as passagens. Mas sabe de uma coisa: apesar disso, ninguém pegou a vez do “vizinho”.

ENFIM, ITALIA...

Pois bem. Por causa do tempo ruim o voo atrasou uns 20 minutos e sò decolamos por volta das 12h55. Uma aeronave mais modesta, mas ainda assim confortàvel - o espaço entre os assentos, nem preciso dizer, né? De Zurique a Milao foi ràpido. ‘As 13h32, oficialmente, pisei em solo italiano, debaixo de chuva e frio, realizando um pedacinho do meu sonho que começou là no ano de 2000. Dizer que os meus olhos nao se encheram de làgrimas seria uma mentira.

Subi por um corredor, dobrei a direita e dei de frente com a tao “temida” imigraçao. Entrei na fila – organizada pelo ‘resto da europa’ – e ali fiquei pensando o que dizer: turismo ou cidadania? Em dois minutos decidi.

Chega a minha vez. Entrego o passaporte e o policial me pergunta: “dove va”? Respondo sem titubear: “sono venuto qua per fare il processo di riconoscimento della mia cittadinanza italiana”. Quando eu respondi dessa maneira, vi que o policial acenou positivamente com a cabeça e jà iria carimbar meu passaporte, mas emendei: “ho qui, con me, la carta di ospitalità della persona che mi riceverà. Se vuole”. Ele diz: “per favore”. Entrego a carta, ele digita algo no computador, carimba meu passaporte e o devolve junto com a carta, me desejando “buona fortuna”. Agradeço e pergunto sobre a nao mais necessidade de fazer a declaraçao de presença, o que o policial me confirma, dizendo que sò o carimbo jà vale por 90 dias. Agradeço mais uma vez e vou até a esteira apanhar minhas malas.

Com tudo em maos, segui até o ònibus que iria a estaçao de trem de Milao. 14h30, o onibus pega a estrada. Era segunda-feira, dia 14 de abril, ùltimo dia de eleiçoes aqui na Itàlia, e o ràdio do motorista, ligado, dava as ùltimas informaçoes e projeçoes do possìvel vencedor. Quando o locutor disse: Silvio Berlusconi, um italiano, sentado duas poltronas a minha frente, soltou aquele velho e conhecido palavrao em italiano: “vaffan….”. E eu pensei comigo: “vai começar o terrorismo de algumas pessoas que prestam serviço para reconhecer a cidadania, dizendo que o Berlusconi vai restringir até a geraçao X ou Y”.

Bem, isso é um outro assunto.

Cheguei a estaçao por volta das 15h40, ainda debaixo de chuva e frio. Fui a loja comprar a passagem com destino a Trieste. Jà havia visto o trem e o horàrio pela internet, quando estava no Brasil, o que agilizou um pouco. O nùmero do trem era 155 e a hora de partida 16h55. Entrei na estaçao de Milao, subi com minhas duas malas e mochila pela escada rolante, validei o bilhete e quando levantei meu olhar para ver o local por completo, meu queixo quase caiu. Que estaçao! Lindìssima! Juro que minha vontade era tirar algumas fotos do lugar, mas eu estava, sem exagero, acabado, querendo entrar no trem e chegar o mais ràpido possìvel a Trieste.

Sò fiz estas fotos, dentro do onibus, quando saì do aeroporto de Malpensa:





FALTA POUCO...

Depois de esperar meia hora e ver o binàrio (local de embarque) mudar tres vezes, chega o trem 155. Subi com minha bagagem, atrapalhando um pouco as outras pessoas – pedi desculpa por isso, lògico. Encostei minha mala maior em um canto, perto da porta. A menor e minha mochila coloquei no assento ao meu lado.

Sentei-me e relaxei, pois a previsao para a chegada era às 21h30. Comecei a conversar com um italiano, perguntando se ele conhecia Trieste. Logo eu disse que era brasileiro e estava na Itàlia para reconhecer minha cidadania italiana. Papo vai, papo vem, um romeno interveio, dizendo que conhecia o Brasil. Trabalhou por alguns anos em navios e fez algumas viagens até o litoral tupiniquim.

O romeno se chamava Gabrielle e desceu logo, em Vicenza. Jà o italiano, Maurizio, desembarcou, assim como eu, em Trieste. O trem atrasou um pouquinho, parando na estaçao triestina às 21h45. A essa hora nao havia mais onibus para onde eu iria, entao o jeito foi pegar um taxi. O faço e chego às 22h27.

CHEGUEI!

As pessoas que me receberam foram o senhor Alessandro, italiano, que morou 35 anos no Brasil, em Belém, e a esposa, brasileira, senhora Beatriz. E eu cheguei bem. Primeiro ato: uma bela testada no batente da porta da casa deles. Doeu. Segundo: banho gelado. O senhor Alessandro me explicou como usar o chuveiro, que eu tinha de abrir pouco para sair àgua quente, mas o espertao aqui abriu MUITO pouco e como eu jà estava sem dormir a mais de 30 horas, querendo um banho e cama, entrei de cabeça debaixo da fria mesmo. Deitei e apaguei.

Calculo que foram mais de 10 mil quilometros e 30 horas sem dormir de Floripa a Trieste, andando de taxi (duas vezez; em Florianòpolis e Trieste), onibus (duas; Sao Paulo e Milao), metro (uma; Zurique), trem (uma; Milao) e aviao (tres; Florianòpolis, Sao Paulo e Zurique). Foi cansativo? Sim, mas nao me arrependo e faria de novo.

MUITO PRAZER, TRIESTE...

Terça-feira, 15 de abril, 10h45. Meu “despertador” foi um pàssaro que pousou na janela do quarto e se pos a cantar. Levantei-me, tomei café e à tarde eu o senhor Alessandro fomos a Trieste. Daqui até là sao 30 minutos, utilizando o transporte pùblico (onibus) que funciona decentemente e, pensando bem, nao é caro – para quem recebe o salàrio em euros, òbvio.

Para exemplificar: comprei uma “tessera”, uma carteirinha, e paguei 26 euros. Com ela, eu posso andar A VONTADE durante todo o mes, utilizando os onibus da “Trasporti Trieste”. Falar a verdade: aqui eu usaria carro sò em caso de emergencia.

Terça-feira foi um dia mais para conhecer a cidade, que é encantadora, e aprender a localizaçao de algumas repartiçoes e pontos importantes. O processo começou mesmo na quarta, dia 16, pela manha.

‘CODICE FISCALE’: A NOVELA...

Acordei cedinho e às 9h fui ao “Ministero dell’Entrate” fazer meu “Codice Fiscale”. Esse é o primeiro passo, antes de ir a “Anagrafe” do Comune, registrar a residencia. Bom, preenchi o formulàrio, o entreguei a uma funcionària, junto com o meu passaporte. Nao demorou muito e ela voltou, dizendo que eu precisava da declaraçao de presença, feita na “Questura”. Respondi a ela, argumentando que nao era mais necessàrio e que o carimbo no passaporte substituia a declaraçao. Nao teve acordo. Fui até a “Questura”. Là, esperei mais de duas horas para ser atendido, e quando fui nao adiantou muita coisa.

11h e pouco cheguei no guiche e expliquei a policial o porque da minha presença ali. Ela, a principio, tambem afirmou que eu teria de fazer a declaraçao mas, logo em seguida, consultando um colega de trabalho, disse que eu deveria me dirigir ao Comune, onde fixaria residencia, fazer o registro na “Anagrafe” e, aì sim, com esse registro, ir ao “Ministero dell’Entrate” fazer o “Codice Fiscale”.

Imagine a minha cara. Pow, eu sabia que o carimbo jà bastava, estava com todas as circulares do Governo a respeito do tema comigo, mas para evitar desgastes com autoridades fiquei na minha e decidi fazer o que a policial disse. Voltei para casa, liguei para a oficial de Estado Civil do Comune (com quem eu jà tinha trocado alguns e-mails antes de vir para cà) e perguntei se ela estaria na prefeitura à tarde. Disse que sim.

15h15. Là estava eu no Comune, explicando todo o caso, onde jà tinha ido, o que haviam me falado etc, etc e etc. Adivinha o que ela me disse? “Sì, veramente, hai bisogno della dichiarazione di presenza”. Olhei para a cara do senhor Alessandro, que me acompanhou em todos esses lugares citados acima, e nao sabia se ria ou se chorava. Dessa vez (a ùnica) nao aguentei e mostrei a circular que afirma que nao é mais necessàaria a declaraçao de presença para quem vem de paises que nao aplicam o acordo de Schengen. Ela leu, mas sabe como é lei, né? Interpretaçao.

Cito o trecho da circular do “Ministero dell’Interno”:

IL DECRETO IN QUESTIONE PREVEDE CHE LO STRANIERO, PROVENIENTE DA PAESI CHE NON APLICANO L’ACCORDO DI SCHENGEN, ASSOLVA L’OBBLIGO DI RENDERE LA DICHIARAZIONE DI PRESENZA.

Traduzindo: O DECRETO EM QUESTAO PREVE QUE O ESTRANGEIRO, PROVENIENTE DE PAISES QUE NAO APLICAM O ACORDO DE SCHENGEN (eu vim do Brasil e passei pela Suìça, que ainda nao faz parte do espaço Schengen), ABSOLVE A OBRIGATOREIDADE DE APRESENTAR O ANUNCIO.

O problema, na verdade, é o verbo “assolvere” que, de acordo com o dicionàrio Michaelis, quer dizer: absolver, perdoar e, ao mesmo tempo, executar, cumprir (dever), honrar (obrigaçao). Quer um termo mais dùbio?

Pois bem. Como nao queria criar confusao com a pessoa que cuidaria do meu reconhecimento da cidadania italiana, perguntei: “allora, cosa devo fare”? Preciso fazer um parentese desde jà, pois a oficial que està cuidando do processo tem sido super atenciosa.

Resposta: “devi andare alla Polizia di Frontiera, a Trieste, e fare la dichiarazione”. Agora era na “Polizia di Frontiera”. Jà eram quase 16h15 da quarta-feira, quando eu e o senhor Alessandro saìmos do Comune. Sinceramente, eu estava bem chateado com a situaçao, pois nao via um final. O senhor Alessandro queria que eu deixasse para o dia seguinte, mas nao quis esperar. Peguei o primeiro onibus para Trieste e saì a procura do prédio da “Polizia di Frontiera”.

Sabia mais ou menos onde era, mas nao me arrisquei e perguntei a algumas pessoas até, às 17h25, encontrà-lo. Cheguei, apertei o interfone, abriram a porta, subi alguns lances de escadas e, no segundo andar, um senhor me aguardava. Perguntou-me em que poderia ajudar e eu, detalhadamente, tim tim por tim tim, contei a ele o que acontecia. Ele me ouviu e disse que eu estava certo – que o carimbo no passaporte valia por 90 dias, nao necessitando fazer a declaraçao.

Sim, isso eu sabia desde o inìcio. Mas como voltar ao Comune com essa afirmaçao em maos e provar que nao estava errado? Nao hà como, né? O que eu fiz? Pedi a esse senhor, com a maior educaçao, para que ligasse ao Comune e falasse com a oficial. Ele o fez e os dois se entenderam rapidamente. Nada de declaraçao. Sò o carimbo.

Agradeci pelo imenso favor, saì do prédio da “Polizia di Frontiera” aliviado e conversando com uma policial que queria saber um pouco sobre o idioma portugues (ela estuda espanhol e està escrevendo um artigo sobre as semelhanças entre essa lìngua e o italiano). Troquei um “dedinho de prosa com ela”, que elogiou o meu italiano, e tomei meu rumo.
Foi uma quarta-feira e tanto. Fizeram-me pular de galho em galho, mas sou teimoso igual a eles. Afinal, tenho o mesmo sangue nas veias.

FIM DA NOVELA...

Na quinta-feira, pela manha, fui novamente ao Comune, com o senhor Alessandro, para ser inscrito na “Anagrafe”, no històrico familiar dele, e registrado como residente no Comune. Aqui, voce pode me perguntar: “e o ‘Codice Fiscale’? Sem ele nao da para fazer o serviço no Comune”. Calma, meu amigo(a). Leia, que voce entenderà.

Bem, a oficial de Estado Civil me pediu desculpa pelo ocorrido do dia anterior e comentou sobre o telefonema recebido da “Polizia di Frontiera”. Eu disse que estava tudo bem. Ela pegou minha pasta com todas as certidoes, olhou – tudo certo – e falou para eu ir até a sala ao lado, fazer a inscriçao anagràfica.

Naquele momento perguntei: “Ma ho bisogno del Codice Fiscale per farlo, no”? A resposta dela foi positiva. Dito isso, foi minha vez de pedir desculpe pelo erro.
Devia ter voltado ao primeiro lugar onde estive, o “Ministero dell’Entrate”. Nao ao Comune.

Mas quer saber a verdade? Fiz isso jà pensado. Da mesma maneira que o policial havia telefonado ao Comune, pedi a oficial de Estado Civil para que ligasse no “Ministero dell’Entrate”. (Nao utilizei esse expediente por hipocrisia. Apenas acho que um cidadao, fora de seus paìs, falando com uma autoridade, por mais que tenha razao, corre o risco de ser mal visto e ter o “filme queimado”. Deixa que eles (Ministero, Questura, Comune e Polizia di Frontiera) se entendam). Ela o fez, falou com a responsàvel e, mesmo assim, quando eu estava saindo da prefeitura, me deu um papel com o nome e telefone do policial que confirmou que o carimbo no passaporte substituia a declaraçao de presença.

Peguei esse papel, deixei minha pasta com os documentos com ela no Comune e eu, sempre na companhia do senhor Alessandro, fui até Trieste, no “Ministero dell’Entrate”, tentar resolver, finalmente, esse embroglio. Entrei, preenchi o formulàrio, peguei uma senha e esperei ser chamado. Nao demorou muito e fui atendido.

Entreguei o formulàrio e o meu passaporte. Adivinha qual foi a pergunta que a funcionària me fez? Sim, essa mesma. Cade a declaraçao de presença? Respirei fundo e là fui eu explicar tudo que jà tinha acontecido, que a oficial de Estado Civil do Comune havia ligado no “Ministero”, falado com a chefe dela, confirmando que o carimbo substituia a declaraçao. Voce acha que ela me escutou? Nao mesmo e ainda levantou a voz. Nem esperou eu responder e foi buscar uma declaraçao de presença – como se eu nunca tivesse visto – para me mostrar como fazer.

O que eu fiz? Esperei ela retornar e me mostrar a declaraçao de presença de um turco. Enquanto ela fazia isso, tirei do bolso da camisa aquele papel que a oficial do Comune me entregou e pedi, com todo o respeito e educaçao, para ela contatar aquele policial. Meio contrariada, ligou.

Bom, para terminar a novela do ‘Codice Fiscale’, depois que ela desligou o telefone, me disse: “sono contenta che abbiamo risolto questo problema. In bocca al lupo, Guaita”. Agradeci e voltei para casa. Nao retornei ao Comune, pois jà era tarde e a “Anagrafe” e o “Ufficio di Stato Civile” estavam fechados. Ficou tudo para o dia seguinte, sexta-feira, 18. Porém, nao imagina como eu estava feliz com o meu tao suado ‘Codice Fiscale’ em maos.

MISSAO CUMPRIDA...

Sexta-feira, dia 18 de abril de 2008, 10h15 da manha. Finalmente fui inscrito como residente no Comune e tenho protocolado o meu processo de reconhecimento da cidadania italiana. Para comemorar, eu e o senhor Alessandro tomanos um “buon vino”.

Friso o excelente atendimento que tive e estou tendo no Comune e, confesso, que estou surpreso pelo lado positivo.

Graças a Deus e a uma amiga, a quem serei eternamente grato, vim para um lugar muito bom. Sem me esquecer, lògico, das pessoas maravilhosas que estao me hospedando: senhor Alessandro e senhora Beatriz.

Agora estou no aguardo das “Mancata” dos Consulados de Curitiba e Sao Paulo para ter minha Certidao de Nascimento transcrita nos livros do Comune e ser reconhecido, oficialmente, como cidadao italiano.

UM MES DE ITALIA...

Depois de fazer o ‘Codice Fiscale’, entregar os atos de Nascimento, Casamento e Morte de meus antepassados, ser inscrito na “Anagrafe” e ter protocolado o pedido de reconhecimento da minha cidadania italiana no “Ufficio di Stato Civile” do Comune, fui conhecer alguns lugares da regiao, com foco maior a Capital, Trieste, que é lindìssima.

Para quem gosta de història e arquitetura, Trieste jà pertenceu a Austria, Veneza, para, depois da Primeira Guerra Mundial (1914 – 1918), fazer parte da Itàlia. Por esse motivo, a cidade lembra e muito as austriacas.

Conheci também o Monte Sao Leonardo, Opicina, Muggia e, claro, jà que é pertinho de Trieste, Veneza.

E’ isso. Espero voltar a escrever em breve com novidades, sejam elas a respeito do meu processo ou alguma curiosidade.

Ah! Sabe como se diz “garota” no dialeto triestino? Nao?! “Mula”.
Nao! Eu nao estou te ofendendo, pelo amor de Deus!
“Garota”, em triestino, é “Mula”. “Garoto” é “Mulo”. Isso mesmo. “Mula e Mulo”.

Entao, com licença, que agora eu vou a Trieste ver “delle belle mule”.
Ciao e arrivederci.